quarta-feira, 14 de outubro de 2015
Série de matérias que remonta a história da gigante Panair do Brasil (Parte II: Padrão Panair).
Quão elevado é o padrão de qualidade de uma empresa ao ponto dela ser referência até mesmo fora do seu segmento? Hoje continuaremos remontando a memória da Panair e veremos como era o seu famoso "Padrão Panair", que era referência não só no setor aéreo, mas em todos os setores de serviços nacionais da época. Veremos hoje também a troca de controle acionário da empresa, que a tornou genuinamente brasileira, e seu ambicioso plano de expansão nas rotas internacionais.
Recordando um pouco da primeira parte desse especial, vimos que 100% do controle acionário da Panair era pertencente aos norte-americanos desde sua fundação. Mas essa condição só durou até 1942. Nesse ano, os acionistas começaram a vender as ações da empresa para empresários brasileiros. Assim, pouco a pouco, contando muitas vezes com o apoio do governo, a Panair foi sendo nacionalizada.
+ Leia também: Boeing 377 Stratocruiser
A participação norte-americana só foi totalmente eliminada em 1961, quando o empresário Celso da Rocha Miranda se associou a Mário Wallace Simonsen, passando a deter 65% do controle acionário da Panair. Como resultado desse processo de nacionalização, a companhia também mudou de nome e passou a se chamar Panair do Brasil.
No ano de 1940, a Panair recebeu o seu primeiro DC-2, que juntamente com o DC-3 viria a se tornar sua principal aeronave para voos curtos na década de 1950. Um ano depois, em 1941, ela inaugurou a rota Rio-Recife-Dakar-Lisboa-Paris-Londres, tornando-se uma das primeiras empresas aéreas internacionais a realizar voos regulares para a Europa após a II Guerra Mundial.
Seguindo na rota do pioneirismo, em 1943, a Panair inaugurou o primeiro voo noturno do Brasil, ligando Rio de Janeiro a Belém. Posteriormente, em 1946, ela foi a primeira empresa aérea fora dos EUA a receber o Lockheed Constellation. Mas isso não é tudo, ela também foi a primeira companhia internacional a pousar no então recém-inaugurado Aeroporto de Heathrow.
Além do pioneirismo, a Panair também se estabelecia no mercado com um audacioso e consolidado plano de crescimento. Expandiu suas operações na América do Sul, operando voos para Assunção, Buenos Aires, Lima, Montevidéu e Santiago. Na Europa, ela também inaugurou rotas para Madrid e Roma, depois aumentou sua malha para Frankfurt, Zurique, Hamburgo, Düsseldorf, Lisboa e Paris, criando uma rede densa de voos para o continente. Ela também conseguiu chegar mais longe, atendendo as cidades de Istambul e Cairo, bem como Beirute, no Oriente Médio.
Como forma de dar capilaridade as suas rotas e evitar concorrência, a Panair também procurou fazer acordos com a Aerolineas Argentinas, Alitalia e Lufthansa. Sempre na frente, em 1953, ela encomendou os modernos Comet, o que faria dela uma das primeiras empresas do mundo a operar jatos. Entretanto, falhas no projeto da aeronave fizeram com que ela cancelasse o pedido. Com o dinheiro que seria destinado ao jato, a Panair comprou o DC-7C para os voos de longo curso.
Dessa forma, a entrada da Panair para a era dos jatos foi adiada para a década de 1960. Os primeiros jatos a chegarem na empresa foram os DC-8, que foram introduzidos nas rotas de longa distância em 1961. Um ano depois, a brasileira também recebia os modernos jatos Caravelle de fabricação francesa, os quais foram introduzidos nas principais rotas nacionais e da América do Sul.
Voltando aos acordos feitos a fim de evitar concorrência desleal, além das parcerias com empresas estrangeiras já mencionadas, a Panair operou o "voo da amizade" em conjunto com a TAP entre 1960 e 1965. Esse voo utilizava uma aeronave personalizada com o nome das duas companhias e tinha tarifas mais baratas, sendo restrito aos brasileiros e portugueses. Já no Brasil, ela fechou um entendimento com a Loide Aéreo Nacional para dividir o território brasileiro em áreas de influência.
Além de ser referência no mercado brasileiro pelo seu gigantismo, a Panair ditava um padrão de qualidade elevadíssimo a nível mundial. O "Padrão Panair", como era conhecido, despontava como referência internacional no setor aéreo numa época em que a aviação era sinônimo de luxo e sofisticação. Suas aeromoças, trilíngues e muito bem preparadas, tratavam os passageiros da melhor forma possível, tarefa que era facilitada pelas taças de cristal, porcelana alemã e talheres de prata.
No Brasil, o termo "Padrão Panair" passou a ser utilizado para tudo que fosse muito bom e insuperável. A excelência dos serviços era de tal grandeza que ficou eternizada em vários filmes e músicas. Os DC-8 da empresa estrelaram a co-produção ítalo-francesa Copacabana Palace (1962), bem como os filmes franceses La Peau Douce (1964) e L'homme de Rio (1964). Na música, ela teve a honra de ser cantada por Elis Regina por meio da canção "Conversando no Bar", uma composição de Milton Nascimento.
Os versos dessa canção, bem como tantos outros, como os do poema "Leilão do ar", de Carlos Drummond de Andrade, eternizaram uma empresa lendária. Entretanto, toda essa tradição, gigantismo e qualidade não foram suficientes para evitar o conchave político-ideológico, o qual abateu a Panair do Brasil, cortando violentamente suas asas e sonhos. Como iremos ver na próxima matéria dessa série, a Panair foi vítima de uma das piores atrocidades praticadas pela Ditadura Militar.
PARTE I: O Começo
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Ótima história. A Panair sem dúvidas fez parte da aviação brasileira.
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